quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Volta às aulas.

Dedico este texto a alguns dos meus professores, alguns deles meus colegas, pelos quais tenho o mais profundo afeto e gratidão pelos valores que me passaram.

A volta às aulas é sempre um momento muito poético. É a renovação do novo ano e a indicação de que a cada ano sempre existe um recomeço. Observando uma escola pública em um bairro periférico de Uberlândia vejo crianças de todas as idades com seus uniformes, e bolsas de todos os tipos. Olhares ávidos de um mundo a descobrir, a utopia do mundo perfeito a ser construído. Mas o que temos a lhes oferecer? O mundo real que fabricamos no dia a dia. O mundo real está dentro das salas de aula. Será que a vida da escola é algo tão poético como a volta às aulas?

Não dá para trancar a realidade do lado de fora da escola. É preciso que muitos recursos cheguem a ela sem se esvair pelo caminho. É preciso que as escolas sejam tratadas como as nossas religiões tratam as nossas igrejas. Com o respeito de locais sagrados que não podem ser conspurcados pela droga, pelo crime e pela corrupção. Não podem ser invadidos ou depredados. Fala-se muito na valorização do professor, faz-se muito pouco verdadeiramente. É preciso agir, é preciso colaborar, é preciso que cada um faça a sua parte. Todos nós, e os poderes públicos também.

E a pequena escola pública de periferia que não tem uma quadra de esportes, que não tem uma biblioteca e nem um laboratório para explicar até mesmo fenômenos simples que ocorrem no dia a dia das nossas cozinhas. Ah, aquela escolinha nos limites urbanos da cidade insiste em sobreviver. O professor brasileiro não desiste, tem uma criatividade do tamanho do mundo que o cerca.

Existindo um teto, um quadro negro para se escrever e surradas carteiras desconfortáveis para os alunos sentarem, lá estará o professor acompanhando seus discípulos na alegria e na tristeza, na saúde e na doença. Não vamos falar aqui de salários, de números, pois para que hoje um professor de primeiro e segundo graus tenha uma parca remuneração é preciso trabalhar 40 horas por semana em pé na frente dos alunos.

Isso é impossível senhor gestor público. Se o professor fizer isso ele vai levar trabalho para casa nos finais de semana, noites e feriados. Vai ter que deixar de ter família e será um monge dedicado à tarefa de ensinar. Está aí explicado porque nossos jovens não encaram a profissão de professor como algo sério. É um bico para se galgar uma próxima etapa. Ninguém quer passar a vida toda recebendo migalhas, e ponto final. Todo jovem sonha em ser um alto executivo de empresa com salário milionário. Não um professor.

O jovem está certo, ele quer ter condições financeiras de poder se informar, viajar, conhecer o mundo, e se aculturar. Conta a lenda que o único profissional japonês que não se curva na presença do imperador é o professor, isto é lá no Japão, aqui na nossa terra o professor é respeitado da boca para fora, como no livro de Joelmir Beting, “Na prática a teoria é outra”.

E a poética da volta às aulas, os nossos jovens a deixam para os livros de poesia e para textos saudosos como este que aqui escrevo. De uma época em que se amarrava cachorro com linguiça, e que crack entre as crianças só podia ser aquele menino bom de bola no recreio. Nessa época o professor usava terno, tinha dignidade e o respeito da sociedade, pois professor é como pai e mãe, todo mundo teve pelo menos um na vida por quem guardasse grande admiração e respeito.


Publicado na Coluna Ponto de Vista
Jornal Correio de Uberlândia
Data: 17/02/2012